O tênue limite entre publicidade governamental e propaganda política
A abertura de uma licitação pela Câmara Municipal de São Paulo no último dia 2 de dezembro colocou em evidência na imprensa, mais uma vez, o debate sobre um dos temas mais controversos do direito administrativo brasileiro: a publicidade governamental. Isso porque pretende-se contratar uma agência de propaganda para prestação de serviços de "comunicação, publicidade e marketing" para a Câmara, a partir de 2010. O Jornal na Tarde não tardou a se manifestar, "praguejando", no editorial da edição do último domingo, dia 6/12, contra o Legislativo paulistano, o que, sem dúvida, foi apenas o primeiro de vários ataques a essa medida.
De fato, a publicidade governamental sempre foi (e dificilmente deixará de ser) um assunto polêmico na realidade política não só brasileira, mas de todas as democracias no mundo. Afinal: onde se encontra o limite entre transparência e publicidade dos atos da administração pública e a autopromoção do governante? A Constituição Federal define, no artigo 37, parágrafo 1º: "A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos". É mostrado, portanto, de forma bastante clara para que deve e para que não deve servir a divulgação das ações dos órgãos públicos.
É importante ressaltar que a publicidade, ao figurar entre os cinco princípios da administração pública brasileira (o famoso "LIMPE"), é reconhecida pela Constituição como um dos pilares de uma verdadeira democracia. É inquestionável o dever da administração pública de demonstrar no que e de que modo é gasto o dinheiro do cidadão/contribuinte. Do mesmo modo, é bastante claro que o pleno exercício da cidadania depende do acesso a informação adequada, o que faz desse um dever do Estado. Sendo assim, em que ponto a publicidade governamental deixa de ser uma garantia os direitos do cidadão para se tornar uma agressão a eles?
A resposta para essa pergunta não é simples. Afinal, dificilmente se encontrará uma manifestação explícita de promoção pessoal do governante ou de seu partido. O grande problema está no fato de que promover os atos do governo é, na maior parte dos casos, também promover quem está no poder, principalmente quando se pensa no Executivo. A propaganda "corrompida" aparece, desse modo, em lugares onde, de fato, se manifesta o caráter "educativo, informativo ou de orientação social" exigido pela Constituição, como em matérias de Diários Oficiais, divulgação de programas sociais, propagandas para "aumentar a confiança" do brasileiro e tantos outros casos.
No entanto, as penalidades àqueles que, comprovadamente, corromperem o princípio da publicidade, podem ser graves. Comprovado o desvio de finalidade da publicidade governamental, a partir de uma ação civil pública, o responsável pode sofrer uma grande variedade de penalidades, que vão do ressarcimento do dano causado aos cofres públicos até a suspensão dos direitos políticos, como definido pela Lei 8.429, de 1992.
Espera-se que nada disso seja necessário e a abertura do novo canal de divulgação das ações da Câmara Municipal de São Paulo represente uma forma de aproximar a população das atividades do Legislativo municipal, possibilitando o controle social dos atos desse Poder. O cumprimento da legislação e o bom uso desse canal dependerão da existência de uma sociedade civil vigilante. Cabe a ela resguardar o bom uso dessa nova forma de comunicação, garantindo que, ao lado do princípio da publicidade estejam "suas irmãs" impessoalidade e moralidade.
Leonardo Spicacci Campos
São Paulo, 6 de dezembro de 2009
Fontes:
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: Casa Civil <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 06 dez. 2009.
JORNAL DA TARDE. Editorial da edição de 6 de dezembro de 2009.
NETTO, A.L.B. A publicidade estatal. Publicado em: <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/1645596/a-publicidade-estatal>. Acesso em: 06 dez. 2009.
RAMOS, D.S. A publicidade dos atos governamentais. Limites, vedações e implicações. Publicado em 08 out. 2009. Disponível em: Artigonal < http://www.artigonal.com/doutrina-artigos/a-publicidade-dos-atos-governamentais-limites-vedacoes-e-implicacoes-1316696.html>. Acesso em: 06 dez. 2009.
RODRIGUES JR., A. Os limites da publicidade institucional oficial. Disponível em: Jus Navigandi < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12122>. Acesso em: 06 dez. 2009.
SÃO PAULO – Câmara Municipal. Concorrência 01/2009. Disponível em: <http://www.camara.sp.gov.br/licitacoesa_com.asp?a1=1&a2=2009&a3=4>. Acesso em: 06 dez. 2009.
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segunda-feira, 7 de dezembro de 2009
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Um comentário:
Prezado Academico Leonardo Spicacci Campos,
muito perspicaz o teu artigo. É realmente tenue o limite entre a publicidade e o marketing pessoal.
Infelizmente a mídia nativa, quando se manifesta criticamente, o faz porque não partilha do quinhão orçamentário dotado para a finalidade de publicizar programas, projetos, ações do poder público.
Mas vejamos que, se diante das placas e promoções a mídia se encarregasse de vetar os 'nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos', nós teriamos avançado muito no aprimoramento da distinção proposta entre a publicidade e a o marketing pessoal.
Mas a mídia nativa, não raro 'Sabuja' como costuma empregar em conceito Mino Carta, se curva ao poder porque dele recebe benesses, não migalhas, mas popudas fatias orçamentárias que as fazem dependentes, muito mais em um país que pouco lê!
A gran finale dessa história ninguém sabe, mas o final do teu argigo é ótimo: vamos juntar aí as irmãs da publicidade, que são a impessoalidade e a moralidade e com esses conceitos, certamente poderemos fazer um enfrentamento, caso a caso, para distinguirmos a publicidade recomendável do merketing pessoal abominável.
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